A cruz parecia o fim. Para os discípulos, era o ponto final de todas as esperanças. O Messias, que eles imaginavam que restauraria o trono de Israel, agora jazia em um túmulo. Ninguém esperava uma reviravolta. Mas foi justamente ali, na manhã do terceiro dia, que Deus virou o jogo da história.
A ressurreição de Cristo não foi apenas um milagre. Foi o começo de uma nova era. Um evento escatológico — ou seja, relacionado ao fim dos tempos — que aconteceu no meio da História. E mais: esse ato único, poderoso e definitivo lançou os fundamentos para a missão da Igreja, trouxe a derrota da morte e iniciou a colheita da ressurreição final.
A vitória escatológica começou no terceiro dia
A ressurreição é o ponto de virada do Novo Testamento. Embora o nascimento e a morte de Jesus sejam fundamentais, é no ato de vencer a morte que tudo se encaixa. Cristo foi despojado na cruz, sim — mas foi na manhã de domingo que Ele retomou o corpo glorificado, enquanto Satanás e seus principados jamais puderam se levantar da derrota.
Jesus venceu onde Adão fracassou. Retomou, com legitimidade, a autoridade que o diabo havia tentado oferecer a Ele na tentação (Mt 4.8-10). Como diz Mateus, após ressuscitar, Jesus declarou: “Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra” (Mt 28.18). Ele venceu de forma justa, pelo caminho do sofrimento e da cruz — e agora reina com autoridade plena.
A ressurreição também abalou profundamente a expectativa dos discípulos. Eles sonhavam com um reino terreno, político, libertador de Roma. Mas o Cristo ressurreto veio inaugurar o Reino de Deus em seu aspecto espiritual. Uma nova era começou: o tempo da Igreja, alimentada pelo Espírito, chamada a ser testemunha da vitória de Cristo sobre a morte.
George Eldon Ladd define com precisão: “A ressurreição de Jesus foi um evento completamente inesperado — não próprio desta era, mas da era vindoura.” Ou seja, foi como se o futuro irrompesse no presente. A nova criação entrou no velho mundo. E isso muda tudo.
Primícias da colheita futura
O apóstolo Paulo entendeu isso com clareza. Ao se deparar com o Cristo ressurreto no caminho de Damasco, sua visão escatológica mudou radicalmente. Como fariseu, ele cria na ressurreição futura, mas agora compreendia que essa ressurreição já havia começado em Cristo — as “primícias dos que dormem” (1Co 15.20).
As primícias, no Antigo Testamento, eram o primeiro fruto da colheita, consagrado a Deus como garantia de que o restante viria. Assim também é Cristo: o primeiro a ressuscitar com um corpo glorificado e incorruptível — sinal de que a grande colheita da ressurreição final está garantida.
Essa verdade é tão central que Paulo afirma: se Cristo não ressuscitou, nossa fé é inútil, e ainda estamos em nossos pecados (1Co 15.17). A ressurreição não é um detalhe, é o coração do Evangelho. Sem ela, tudo desmorona.
A ressurreição e a missão da Igreja
A vitória de Jesus sobre a morte deu base para a missão da Igreja. Como disse John Stott, “a ressurreição abastece o mandato missionário”. É por causa da ressurreição que podemos anunciar, com autoridade e esperança, que o Reino de Deus já chegou, e que há salvação para todo aquele que crê.
Os poderes do século vindouro já atuam no presente. Como novas criaturas (2Co 5.17), vivemos na sobreposição entre a era antiga e a nova era. A cruz garantiu a vitória, e a ressurreição colocou essa vitória em movimento. Ainda esperamos a consumação — a plena colheita — mas já desfrutamos dos primeiros frutos.
É por isso que Paulo escreve: “O último inimigo a ser destruído é a morte” (1Co 15.26). Ela já foi juridicamente vencida, mas será definitivamente derrotada na segunda vinda de Cristo, quando todos os crentes ressuscitarão em glória.
Conclusão: Vivemos na era da ressurreição
A ressurreição de Jesus foi mais do que um milagre poderoso. Foi o ponto de virada da história. Ela não apenas reverteu a aparente derrota da cruz, mas inaugurou um novo tempo — o tempo em que o Reino de Deus avança, em que o Evangelho é pregado a todas as nações, e em que a morte já não tem a palavra final.
A ressurreição é a certeza de que tudo o que Cristo conquistou será plenamente aplicado ao Seu povo. É a base da nossa esperança, a força da nossa missão, e a garantia da nossa vitória final. Como disse Paulo: “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes, inabaláveis, e sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho não é vão” (1Co 15.58).
Cristo ressuscitou. E isso muda tudo.
Bibliografia
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